Seguem excertos de uma mensagem que recebi, por e-mail, de um amigo, o jornalista Lauro Neto, de O Globo, sobre fatos que ele presenciou no trato que as "autoridades" públicas dispensam aos cidadãos cariocas:
"Caros amigos,
acabo de chegar em casa depois de um plantão que deveria ter durado sete horas, mas durou 14. Pois é. Jornalista não é médico, mas também dá plantão. Pois bem. Acompanhei o calvário de Liliam Gonzaga, uma favelada como outras tantas, que agonizou mais de 30 horas para achar o corpo do seu filho Wellington, morto pelo Exército em conluio com traficantes. Os detalhes, se vocês quiserem, leiam na edição desta segunda [dia 16 de junho de 2008] do Globo.
Durante seis horas, acompanhei a Via Crucis dessa mãe, que poderia ser a minha ou a de vocês, mas era só a de mais um favelado. A diferença é que essa mãe, mesmo na hora do sofrimento, mostrou-se generosa e solidária quando a acompanhei de carona em uma Kombi da 4a DP até um quartel do Exército no Santo Cristo. Ao descer do veículo, ela falou com um dos amigos que seguiam junto: "Paga a passagem do menino aí", referindo-se a mim. Até tinha dinheiro para pagar, mas, desnorteado, aceitei a demonstração de generosidade como quem aceita um chope pago por um amigo no buteco.
Essa mãe, que já havia perdido um filho há dez anos vítima de uma queda da laje, perdeu outro ontem, fuzilado com mais de 20 tiros. O que mais choca é que aqueles que deveriam zelar por nossa segurança estão por aí tirando vidas e se misturando com bandidos, tornando-se parte deles. Ontem, quando estava descendo o Morro da Providência, uma técnica de enfermagem falou a frase que resume meu sentimento desde o início do acompanhamento desse caso: "A ditadura voltou".
E não voltou apenas para os favelados não. Em frente ao quartel do Santo Cristo, um soldado apontando um fuzil para a gente ameaçou os fotógrafos dizendo que se tirassem fotos, iriam meter bala. Não por coincidência, não havia repórteres do jornal O Dia cobrindo esse caso. Vocês devem ter visto que uma equipe deles foi torturada no Batan por um grupo de milicianos.
Só não adianta chorar depois que a morte bater à nossa porta, que fazemos parte de uma elite que assiste a tudo silenciosamente. Aí não terá volta. Será igual ou pior do que há 40 anos.
Isso tudo, meus amigos, para pedir que cada um de vocês faça o que estiver ao seu alcance para mudar a situação em que se encontra o Brasil, e mais especificamente o Rio de Janeiro.
Desculpem o desabafo, mas temos que fazer algo para mudar o país e a cidade que serão habitados por nossos filhos."
segunda-feira, 16 de junho de 2008
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