domingo, 8 de março de 2009

A decisão do Supremo Tribunal Federal sobre Execução Provisória de Pena

O acórdão do Supremo Tribunal Federal que julgou o Habeas Corpus nº 84.078 repercutiu na mídia como uma bomba, dando causa a manchetes dos principais periódicos escritos e em sites de notícias, além dos telejornais o terem como primeira e principal notícia. Na verdade, muito alarde por nada.

A decisão só veio mais uma vez confirmar o entendimento do Supremo, já há muito consolidado, sobre o princípio constitucional da não culpabilidade. Aliás, seria difícil ter outro entendimento que não esse, já que o que o Supremo disse, ele repetiu o que já está dito expressamente na própria Constituição de 1988 (art. 5º, LVII e LXI).

O princípio é simples: o processado não pode ser preso apenas em função de uma decisão judicial que prevê pena de prisão, se ainda cabe recurso desta decisão. Ou seja, sem o trânsito em julgado não se executa a pena de prisão. O que poucos estão tentando explicar (nós inclusive) é que isso se dá sem prejuízo da decretação de prisão preventiva (por um dos quatro motivos previstos em lei – no artigo 312 do Código de Processo Penal – como requisitos seus). Isto também está, por óbvio, na decisão do STF.

Ou seja, se um Juiz condena alguém a pena de prisão em que não caiba qualquer benefício, o condenado só vai preso se não houver recurso defensivo (e o conseqüente trânsito em julgado) ou se o Juiz decretar, junto da sentença, a prisão preventiva. O mesmo vale para o Tribunal de 2ª instância. Se o acórdão previr pena de prisão em que não caiba qualquer benefício, o condenado só vai preso se for decretada também pelo Tribunal a prisão preventiva ou se não houver recurso da defesa, mais uma vez transitando em julgado a decisão. O mesmo pro Superior Tribunal de Justiça, a menos que o julgamento do recurso nele implique o trânsito em julgado.

Portanto, a afirmação da mídia de que a partir de agora só se vai preso depois de julgado o último recurso, não é verdadeira. A decretação da prisão preventiva é comum, apesar de ser tratada pela nossa constituição e pela lei como exceção. O acusado pode ir preso, independente da fase do processo ou recurso, “por garantia da ordem pública”, “da ordem econômica”, “por conveniência da instrução criminal” ou ainda “por garantia da aplicação da Lei penal” (os tais “quatro motivos” mencionados antes).

Para falar destes motivos, teremos que escrever outro artigo. Mas para se ter uma idéia, a prisão preventiva advém, contemplando alguns exemplos, se o Juiz suspeitar de que o acusado irá fugir, irá pressionar, ameaçar ou subornar testemunhas, se pode influenciar na falsificação de alguma prova documental ou até mesmo se sua liberdade causar instabilidade social. Como os motivos da Lei são subjetivos, o magistrado os interpreta segundo seu entendimento e os aplica ao caso concreto também segundo suas próprias conclusões. Daí a facilidade de se decretar uma prisão preventiva.

Em recente pesquisa publicada no jornal O Globo, constatou-se que 54 % dos presos do Estado do Rio são provisórios, ou seja, tiveram sua prisão preventiva decretada ou tiveram negada a liberdade provisória pelos mesmos motivos expostos.

Assim, duas coisas que contrariam o sistema jurídico brasileiro são: a decretação da prisão preventiva como antecipação de pena e a execução provisória (pois ainda cabe recurso) da pena de prisão. E isto vem acontecendo com imensa freqüência. O Supremo, mais uma vez alerta para a inconstitucionalidade disso.

Mais uma vez o Supremo apenas vem proteger o princípio constitucional da não culpabilidade, mais conhecido por presunção de inocência (nome juridicamente errado perante a redação do nosso princípio, mas isso é assunto para outro artigo). Como disse, beira a impossibilidade outra interpretação, eis que expresso na Constituição. Existe apenas uma única saída para os inconformados: mudar a Constituição.